Wednesday, March 28, 2012

O jogo começou


UFBA - IHAC - Oficina preparatória do Corpocidade 2012
Jogo de Cintura e Uso do Espaço em Salvador
Profs. Francisco Antônio Zorzo e Cristiano Figueiró

A oficina pretende desenvolver atividades práticas e teóricas relativas ao tema das improvisações corporais e do jogo de cintura no uso do espaço urbano. Pensar a vida urbana através do jogo de cintura vai no sentido de elaborar material preparatório para as oficinas do Corpocidade, que se darão em 23 e 24 de abril de 2012.

 


O objetivo é observar, a partir de certas situações encontradas no cotidiano da cidade, como se produz o jogo de cintura. Por ocasião do Corpocidade (www.corpocidade.dan.ufba.br) parece muito acertado entrar na discussão dos modos com que a população enfrenta os problemas urbanos. As práticas corporais podem desobedecer ao edifício de normas e regras socialmente reconhecidos, compondo procedimentos criativos que se infiltram no conjunto normativo.

Na metrópole contemporânea, precisamos inventar procedimentos corporais para sobreviver às mais desfavoráveis relações de força, sabendo-se que nem todas podem ser enfrentadas diretamente. Enquanto o poder se organiza e se exerce no cotidiano a partir de inúmeros pontos, de relações assimétricas e comandos, os procedimentos criativos (ZORZO, 2007) são acontecimentos da linguagem que proporcionam saídas e resistências ao sistema normativo (Deleuze, 1997, p. 21).


Pode-se tomar um exemplo de procedimento criativo presente na arte brasileira contemporânea, que é a ginga (JACQUES, 2003). A capoeira introduz uma diferença cultural, com a qual o corpo se abre para contornar os axiomas e as pressões do sistema (SODRÉ, 1983). O melhor desse exemplo é que proporciona um modo de sociabilizar o conhecimento (mão dupla comunidade-grupo), pois o desejo dos integrantes da oficina é o maior engenho a ser mobilizado nas atividades. O jogo de cintura é empregado em quase todas as interações sociais. O sujeito conta com formas culturais que fornecem apoio para os enfrentamentos, movimentos e as fugas cotidianas, tais como a capoeira, o samba, o futebol, os mitos e narrativas, usos alternativos do meio computacional, o jogo das trocas ...

As práticas corporais, tal como no exemplo, formam um corpus de saber que é identificável em alguns lugares, em outros bem menos. Elas não formam um algoritmo perfeito e completo. Seus efeitos sobre o cidadão como formas de sobrevivência são os mais variáveis. Elas são algo arisco e sutil, que não se entrega facilmente ao olhar do outro, que constitui um sistema de gozo muitas vezes inédito. São pequenas soluções, terápicas ou traumáticas, que por sua vez desenvolvem jogos leves ou tensos, brincadeiras singelas ou pesadas, a depender do caso, com que se consegue gozar por mecanismos muitas vezes desconhecidos.

Do desafio que está lançado na oficina, a solução para a questão “cadê o jogo de cintura?” precisa emergir da interação dos participantes. Por coerência com a proposta, desde o inicio, deveremos atuar com muita ginga e atenção relacional na hora de formular o método e encarar o problema.

Com procedimentos artísticos, pretendemos pesquisar movimentos e desejos que podem transgredir as formas mecânicas da realidade ordinária (ANDRADE, 2008). Podemos aperfeiçoar procedimentos do jogo da vida e levá-los a outros campos. Por exemplo: Contar com a proliferação dos hackers, já que a vida cotidiana está associada com o uso dos meios virtuais. A tecnologia ficou mais sofisticada e complicada, mas a técnica, com o devido jogo de cintura, ainda permite que se possa hackear, ou seja desenvolver usos novos empregos da informática e criar programas alternativos de computação.

A troca de ideias passa a ser o principal motivo da oficina.  Além do humor de falar de experiências e de trocar narrativas, somam-se a performance  e o jogo. Quer dizer, no caso do Corpocidade, o procedimento deve ser explicitado no corpo de cada jogador e não apenas no modo verbal e discursivo. Mas cadê a linguagem adequada? É preciso encontrar o procedimento com que vamos seguir adiante e resistir através das nossas próprias descobertas.

Referências
Andrade, Antônio Luis M. Escritos sobre Arte. Salvador: Cispoesia, 2008.
Deleuze, Gilles. Crítica e Clínica. São Paulo. Ed. 34, 1997.
Jacques, Berenstein Paola. A Estética da Ginga. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2003.
Sodré, Muniz. A Verdade Seduzida. Rio de Janeiro: Codecri, 1983.
Zorzo, Francisco Antônio. Procedimentos Visuais: Alguns Problemas do Desenho Contemporâneo. In: Anais do Graphica 2007. Curitiba: Universidade Federal do Paraná, 2007.